O Abuso da Penhora on line

Décadas atrás, a busca pela efetividade da prestação jurisdicional passou a admitir a intitulada penhora on line. O juiz, provocado, defere o pedido de bloqueio on line e, através de senha pessoal do magistrado, os ativos financeiros do devedor ou de terceiros são bloqueados.

Por: ESA/OABSP - 06/06/2012

Contudo, ao nosso sentir, no desbrochar do século XXI, a penhora on line foi arrastada à banalização e tornou-se protagonista de torrencial ilegalidades e instabilidade econômica, sob violação da segurança jurídica.

É preciso afirmar que não há qualquer dúvida quanto à obrigação do devedor adimplir os seus débitos, por força da penhora on line.

Entretanto, a penhora on line vem sendo malsucedida, sobretudo quando afeta terceiros não participantes do processo.

A facilidade de seu manuseio culmina em frequentes desvios, sob lesão da própria razão de ser do instituto. Há casos em que ela é concedida sem a necessária fundamentação legal, e amiúde sem a efetiva intervenção do juiz, vez que o poder é delegado, ilegalmente, a um funcionário do cartório.

O que haveria de ser rápido, impõe brutal atraso ao processo, a provocar prejuízo ao credor (que não vê o seu direito efetivado) e causar dano irreversível ao suposto devedor (que se desvencilha da ilegal penhora, sob alto custo de tempo-dinheiro), cenário que pulveriza o descrédito ao Judiciário.

O sistema jurídico exige que o pedido de penhora on line e a decisão judicial sejam fundamentados. Todavia, como não há um critério explícito de requisitos objetivos a serem preenchidos, não raro, são formulados pedidos sem qualquer fundamentação ou sob base pífia, ou ainda desprovido de qualquer documento particular ou público (como contrato ou estatuto social), que possam comprovar o alegado direito de exercer a penhora sobre patrimônio alheio, não participante do processo. Sim, quando a penhora é disparada contra o devedor as chances de erro são diminuídas consideravelmente.

Contudo, quando a penhora on line recai sobre terceiro estranho à lide como os homônimos, os ex-sócios ou ex-diretores da empresa executada, a situação é dramática. O homônimo terá de contratar advogado, seu patrimônio restará indisponível por longo período. Empresas com nomes semelhantes à executada devem comprovar a similaridade da razão social e, não raro, com ilegal inversão do ônus da prova, são obrigadas a comprovar que não-fazem parte do grupo econômico executado.

Situação ainda mais abusiva é a posição ocupada por ex-sócios e ex-diretores de empresas executadas ao sofrerem os efeitos da penhora on line. Por absoluta falta de legislação específica que imponha critérios objetivos na formulação de pedido, os sujeitos têm suas contas bancárias, assacadas ilegalmente, máxime na área trabalhista.

O primeiro impacto provocado é o afastamento de competentes administradores, advogados etc. dos quadros diretivos das empresas.

Note-se, a lei não exige dos juízes decisão liminar na defesa dos terceiros que muitas vezes aguardam anos e anos a fio para obter a liberação dos seus recursos bloqueados. Por isto, faz-se necessário prever, por texto legal, a condenação de sucumbência àquele que pede penhora on line e sai perdedor (seara trabalhista).

Posto isto, cremos que antes do pedido de redirecionamento da execução para os terceiros à lide, faz-se necessário o preenchimento de requisitos objetivos:(i) o pedido de desconsideração e a decisão deferitória devem ser fundamentados (art. 93, IX, da CF); (ii) o pedido deve demonstrar (e não só alegar) que houve o abuso da personalidade jurídica da empresa executada pelos sócios e deve comprovar o desvio de finalidade, ou a confusão patrimonial entre a empresa executada e os seus sócios (art. 50 do CC); (iii) o pedido deve demonstrar que os bens da empresa executada já foram executados (art. 596, do CPC); (iv) o pedido deve comprovar que o terceiro é sócio atual da empresa executada, ou sua retirada a menos de 02 anos (art. 1.032 do CC).

O projeto do Novo Código de Processo Civil traz avanços ao garantir o contraditório prévio à desconsideração da Pessoa Jurídica.

A efetividade e rapidez jurisdicional é imprescindível no Estado de Direito. A penhora on line é eficiente, sobretudo ao atingir o patrimônio do próprio devedor recalcitrante. Porém, a realização de penhora on line de forma afoita, sem o respeito à balizas legais já existentes e sem qualquer critério objetivo é, ao nosso sentir, manifestamente ilegal e prejudicial ao tecido social. O problema está no excesso do uso sem critérios. Coibir este abuso exige mudança de pensamento social, cultural e jurídico. Há necessidade premente da alta cúpula do País debruçar-se sobre este problema daninho e causador de injustiças abomináveis.


Marcos Paulo Passoni – Advogado em São Paulo