No dia 1º de maio do ano de 1943, dia do trabalhador, como se sabe, Getúlio Vargas, em um gesto grandiloquente, anunciava a promulgação de uma Carta de Direitos dos Trabalhadores, no Estádio de São Januário. A Consolidação das Leis do Trabalho, além de compilar o resultado da intensa produção legislativa ocorrida na década anterior, supriu os claros normativos deixados pela normatização trabalhista pulverizada por categorias profissionais, como se recorda.
Por: ESA/OABSP - 06/10/2011
Passados quase setenta anos da sua edição, não se pode negar que o diploma dá sinais de uma certa fadiga, muito embora, entre os seus preceitos, possa ser identificado um núcleo de direitos e garantias fundamentais reputados atemporais e mesmo universais, por espelharem um patamar mínimo de dignidade assegurado aos trabalhadores.
Seja como for, é inegável que o texto está a exigir uma depuração das suas principais obsolescências, sobretudo quanto às incompatibilidades que se divisam entre os seus dispositivos e a atual Carta Constitucional, tanto no tocante ao Direito Material do Trabalho – como ocorre no caso do percentual do adicional de horas extras (v.g. o art. 59, § 1º, da CLT, que fixa o adicional de horas extras em 20%, enquanto o art. 7º, XXVI, da Constituição estabelece um adicional mínimo de 50% para o serviço extraordinário), do capítulo da estabilidade decenal (especialmente o art. 492 que assegura tal garantia de emprego substituída pelo regime do FGTS positivado constitucionalmente) , do aviso prévio de 8 dias (art. 487 da CLT fala de um aviso prévio de 8 dias e o art. 7º, XXI, da Constituição prevê o mínimo de 30 dias) -, como em relação ao Processo do Trabalho – como se dá no caso da referência que ainda se faz às Juntas de Conciliação e Julgamento (em todo o Capítulo II do Título VIII da CLT), órgãos colegiados e paritários que desapareceram com a Emenda Constitucional 24/99, a qual selou o fim da representação classista na Justiça do Trabalho.
Nesse contexto, o Tribunal Superior do Trabalho não se furtou à sua missão institucional de uniformizar a interpretação da legislação federal trabalhista, o que exigiu não só a fixação do alcance semântico, mas a própria atualização de sentido das normas trabalhistas consolidadas. Para isso, aprovou, no curso de sua existência, mais de 1.000 verbetes, computadas as então 425 súmulas (agora, passarão a 429), 694 orientações jurisprudenciais (13 do Tribunal Pleno, 411 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais ou SbDI-1, 76 transitórias, 156 da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais ou SbDI-2, 38 da Seção de Dissídios Coletivos – SDC), e 119 precedentes normativos (serão 120, a partir da próxima semana).
Convém notar que, suprindo a inércia do legislador, a jurisprudência da Corte Superior Trabalhista gestou e passou a albergar novos institutos, como as conhecidas “horas in itinere” os minutos residuais, contemplados, inicialmente, apenas em textos sumulares (Súmulas 90 e 366 do TST) e que, posteriormente, migraram para o art. 58, em seus respectivos §§ 1 º, 2º e 3º, da CLT.
Em virtude da dispersão dos temas entre os vários instrumentos de cristalização jurisprudencial e do natural processo de desatualização a que foram submetidos, com o advento de alterações legislativas supervenientes, no ano de 2003, o Tribunal houve por bem proceder a uma abrangente revisão de sua jurisprudência, o que resultou em uma ressistematização de seus verbetes, com a reunião de orientações jurisprudenciais e súmulas que versavam sobre as mesmas matérias (tal como se verificou, ilustrativamente, com a redação conferida à Súmula 6 sobre equiparação, a qual incorporou várias orientações jurisprudenciais), além de conduzir à edição e cancelamento de diversas súmulas.
Após quase uma década, empresários, sindicalistas, advogados trabalhistas, procuradores do trabalho e outros operadores do direito que militam na área trabalhista voltaram seus olhos com maior atenção e expectativa para o Tribunal Superior do Trabalho na semana que foi do dia 16 ao dia 20 de maio de 2011.
A “Semana do TST” , como foi denominada, foi uma oportunidade em que a Corte Superior Trabalhista, após quase uma década da sua última revisão jurisprudencial , pôde suspender as suas atividades judicantes para debruçar-se sobre sua jurisprudência e suas normas, por meio de uma análise pontual a respeito dos aspectos mais controvertidos.
Qualquer avaliação sobre os impactos das medidas adotadas, naturalmente, revela-se precipitada. Ainda é muito cedo para aquilatar as implicações de tal “reforma” jurisprudencial, mas podem ser inferidas algumas inclinações a partir das alterações introduzidas.
O singelo propósito do presente texto é o de noticiar, de forma panorâmica, as principais modificações que foram introduzidas nos instrumentos de uniformização da jurisprudência trabalhista adotados pelo Tribunal Superior do Trabalho, registrando suas possíveis razões e desdobramentos.
2. Alterações na jurisprudência do TST acerca do Direito Material do Trabalho
No tocante ao Direito Material, pode-se afirmar, de início, que um dos principais destaques da revisão jurisprudencial foi a ampliação da ênfase protetiva no concernente aos limites da negociação coletiva, particularmente em matéria de segurança e saúde do trabalho, o que se pode extrair do cancelamento da Súmula 349 e do item II da Súmula 364 e da Orientação Jurisprudencial Transitória 4 da SbDI-1.
Também pode ser observada uma maior reverência ao princípio protetivo na alteração da redação da Súmula 291, com a inserção da possibilidade de indenização pela supressão de horas extras habituais mesmo na hipótese de supressão parcial.
Foram enfrentadas, de outro lado, questões de alta indagação teórica e de graves repercussões práticas, como foi o caso da revisão da Súmula 331 do TST, em que se procurou determinar as implicações da decisão do Supremo Tribunal Federal na célebre ADC 16, proposta pelo Governo do Distrito Federal.
Além disso, foram referendas as diretrizes que já vinham sendo adotadas pelos órgãos fracionários do TST, relativamente à indenização pela supressão parcial de horas extras habituais, ao cômputo do tempo de deslocamento entre a portaria e local da prestação de serviços, ao alcance subjetivo da estabilidade sindical e ao tempo de vigência e efeitos das sentenças normativas. Entretanto, verificou-se uma guinada na jurisprudência em questões como a do enquadramento dos advogados empregados de instituições bancárias e a aplicação da jornada reduzida prevista no art. 224 da CLT aos operadores de “telemarketing”.
Em seguida, serão analisadas essas e outras matérias que constituíram o epicentro das discussões ocorridas durante a “Semana do TST”.
2.1. Negociação coletiva em matéria de segurança e saúde do trabalhador
A Súmula 349 do TST, que veio a ser cancelada durante a “Semana do TST”, albergava a seguinte diretriz, admitindo a validade de instrumento coletivo que autorizasse a compensação de jornada em atividade insalubre, mesmo sem a prévia inspeção dos órgãos de fiscalização do trabalho:
“ACORDO DE COMPENSAÇÃO DE HORÁRIO EM ATIVIDADE INSALUBRE, CELEBRADO POR ACORDO COLETIVO. VALIDADE. A validade de acordo coletivo ou convenção coletiva de compensação de jornada de trabalho em atividade insalubre prescinde da inspeção prévia da autoridade competente em matéria de higiene do trabalho (art. 7º, XIII, da CF/1988; art. 60 da CLT)”.
Já a Súmula 364 do TST, perdeu o seu item II, o qual estabelecia a possibilidade de fixação proporcional do adicional de periculosidade, em relação ao tempo de exposição ao risco:
“ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. EXPOSIÇÃO EVENTUAL, PERMANENTE E INTERMITENTE.
I – Faz jus ao adicional de periculosidade o empregado exposto permanentemente ou que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco. Indevido, apenas, quando o contato dá-se de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido.
II – A fixação do adicional de periculosidade, em percentual inferior ao legal e proporcional ao tempo de exposição ao risco, deve ser respeitada, desde que pac-tuada em acordos ou convenções coletivos.
Ocorreu, ainda, a supressão da Orientação Jurisprudencial Transitória 4 da SbDI-1, especificamente destinada à Mineração Morro velho e cuja redação era a que se segue:
MINERAÇÃO MORRO VELHO. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. ACORDO COLETIVO. PREVALÊNCIA
O acordo coletivo estabelecido com a Mineração Morro Velho sobrepõe-se aos comandos da lei, quando as partes, com o propósito de dissipar dúvidas e nos exatos limites de seu regular direito de negociação, livremente acordaram parâmetros para a base de cálculo do adicional de insalubridade.
O cancelamento dos verbetes foi uma clara sinalização no sentido de que a Superior Corte Trabalhista passará a limitar o alcance da autonomia privada coletiva no concernente a regras de segurança e saúde do trabalhador.
Nesse particular, foi descartada a distinção feita pela posição minoritária na jurisprudência do TST, capitaneada pelo Min. IVES GANDRA FILHO, entre as dimensões econômica e da infortunística laboral (ou da segurança propriamente dita), em relação às regras de segurança e saúde do trabalhador. A perspectiva econômica diria respeito, fundamentalmente, ao pagamento dos adicionais de insalubridade e periculosidade, os quais, ostentando natureza salarial (ou, ao menos, de salário-condição) poderiam ser flexibilizados, à luz do art. 7º, VI, da CF. Já a dimensão da segurança do trabalho estaria relacionada às normas a respeito das condições que deveriam ser respeitadas pelo empregador para preservar a integridade física dos trabalhadores que lhes prestassem serviços, contempladas, sobretudo, no Capítulo V da CLT e nas Normas Regulamentadoras (NR’s) do Ministério do Trabalho, em que são exigidos, entre outros, o fornecimento de equipamentos de proteção e a adoção de medidas preventivas de medicina do trabalho. Apenas esse segundo aspecto é que não poderia ser flexibilizado, de acordo com tal entendimento, que foi, entretanto, rejeitado.
A principal linha de argumentação que levou ao cancelamento dos aludidos textos foi a de que a forma mais eficaz de dissuasão das práticas (comissivas ou omissivas) deletérias dos empregadores em matéria de segurança e saúde do trabalhador seria exatamente a pressão econômica. Também deve ser recordada a atuação do chamado “princípio da adequação setorial negociada”, que descreveria as possibilidades e limites da negociação coletiva e foi assim enunciado por GODINHO DELGADO:
Pelo princípio da adequação setorial negociada as normas autôno¬mas juscoletivas construídas para incidirem sobre certa comunidade econômico-profissional podem prevalecer sobre o padrão geral heterôno¬mo justrabalhista desde que respeitados certos critérios objetivamente fixados. São dois esses critérios autorizativos: a) quando as normas autônomas juscoletivas implementam um padrão setorial de direitos su¬perior ao padrão geral oriundo da legislação heterônoma aplicável; b) quando as normas autônomas juscoletivas transacionam setorialmente parcelas justrabalhistas de indisponibilidade apenas relativa (e não de indisponibilidade absoluta) .
Consoante o magistério de DELGADO, um dos principais exemplos que ilustram os direitos indisponíveis que demarcariam os lindes da adequação setorial seriam, justamente, as normas de segurança e saúde no trabalho:
(…) não prevalece a adequação setorial negociada se concer¬nente a direitos revestidos de indisponibilidade absoluta (e não indispo¬nibilidade relativa), os quais não podem ser transacionados nem mesmo por negociação sindical coletiva. Tais parcelas são aquelas imantadas por uma tutela de interesse público, por constituírem um patamar civili¬zatório mínimo que a sociedade democrática não concebe ver reduzido em qualquer segmento econômico-profissional, sob pena de se afronta¬rem a própria dignidade da pessoa humana e a valorização mínima defe¬rível ao trabalho (arts. 1º, III e 170, caput, CF/88). Expressam, ilustrativa¬mente, essas parcelas de indisponibilidade absoluta a anotação de CTPS, o pagamento do salário mínimo, as normas de saúde e segurança no ambiente do trabalho .
2.2. Indenização por supressão parcial de horas extras – alteração da Súmula 291 do TST
Do IUJ 10.700/07 resultou duas mudanças de redação da Súmula 291 do TST, a qual trata, como se recorda, da indenização decorrente da supressão de horas extras habituais. O verbete passou a ter o texto a seguir:
“HORAS EXTRAS. A supressão, total ou parcial, pelo empregador, do serviço suplementar prestado com habitualidade, durante pelo menos 1 (um) ano, assegura ao empregado o direito à indenização correspondente ao valor de 1 (um) mês das horas suprimidas, total ou parcialmente, para cada ano ou fração igual ou superior a seis meses de prestação de serviço acima da jornada normal. O cálculo observará a média das horas suplementares nos últimos 12 (doze) meses anteriores à mudança, multiplicada pelo valor da hora extra do dia da supressão”.
A redação foi alterada apenas para esclarecer que a indenização poderá advir da supressão parcial da prestação habitual de horas extras, ratificando posição já encampada pela Corte . Ademais, o critério de cálculo, consagrado no final do verbete também sofreu uma pequena mudança, para explicitar que os últimos doze meses referem-se aos imediatamente anteriores à supressão.
Vale notar que esse entendimento aplica-se até mesmo à Administração Pública e ainda que a determinação para a supressão tenha sido judicial, em ação civil pública , ou resultante de termo de ajuste de conduta firmado com o Ministério Público do Trabalho , segundo a jurisprudência do TST. Hipótese interessante e controvertida diz respeito à situação em que a supressão de horas extras habituais decorre de prescrição médica. Nesse caso, foi prolatado acórdão na 8ª Turma no sentido de se afastar a aplicação da indenização prevista na Súmula 291 do TST , mas a decisão foi reformada pela SbDI-1 do TST, determinando a redução da indenização pela metade, por equiparação à situação de força maior, à luz dos arts. 501 e 502 da CLT .
2.3. Terceirização na Administração Pública, contratado de empreitada e responsabilidade trabalhista
Entre os temas mais controvertidos no âmbito material, figurava a questão da responsabilidade trabalhista em caso de terceirização e de contrato de empreitada, a respeito dos quais versavam a Súmula 331 e a Orientação Jurisprudencial 191 da SbDI-1.
Em relação ao primeiro verbete, a principal discussão residia na definição das implicações da decisão do Supremo Tribunal Federal no ADC 16 , em que se reconheceu a constitucionalidade do art. 71 da Lei 8.666/93, que, em tese, isentaria os entes públicos da responsabilidade pelos créditos trabalhistas não adimplidos pelas empresas prestadoras de serviços contratada por meio de procedimento licitatório.
Entretanto, em face da própria sinalização do STF no sentido de que, não obstante o reconhecimento da constitucionalidade do aludido dispositivo legal, seria possível a responsabilização da Administração Pública, em caso de demonstração de culpa “in vigilando” ou “in eligendo", os julgamentos no TST que se seguiram à referida decisão do STF mantiveram, em regra, a imputação de responsabilidade à Fazenda Pública, nos casos em que as instâncias ordinárias consignaram a existência de culpa .
Nessa mesma direção, seguiu a alteração que se verificou no texto da Súmula 331 do TST, que incorporou a diretriz estabelecida pela Suprema Corte, nesse particular . Além disso, na esteira do entendimento já consensual de suas Turmas e mesmo da SbDI-1, foi definido o alcance da responsabilização subsidiária, que abrange todas as verbas trabalhistas devidas pelo prestador de serviços.
A Súmula 331 do TST agora passou a exibir as seguintes diretrizes:
“CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE
I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV – o inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação, referentes ao período da prestação laboral”.
Mister salientar que, após intenso debate, foi descartada a tese da responsabilidade objetiva, em primeiro lugar, em virtude da clara orientação do Excelsa Corte, nesse particular, assim como da presunção “omnis” de culpabilidade dos entes públicos em caso de contratação de prestadores de serviços. De outra parte, note-se que se preferiu empregar a expressão “evidenciada” em lugar de “comprovada”, para denotar a possibilidade de mitigação da distribuição do encargo probatório quanto à culpa, que, aliás, não foi definida. Além disso, embora a súmula tenha feito expressa referência à culpa “in vigilando”, não foi, explicitamente, elidida a viabilidade de demonstração de culpa “in eligendo", diante da utilização do advérbio “especialmente”.
Releva assinalar, ainda, que foi rejeitada a proposta de incorporação à Súmula 331 da Orientação Jurisprudencial 383 da SbDI-1, que trata da isonomia entre terceirizados e empregados do tomador de serviços.
Já quanto à Orientação Jurisprudencial 191 da SbDI-1, que trata da responsabilidade do “dono de obra” em contrato de empreitada, permaneceu praticamente incólume, mesmo depois de intensos debates em torno de seu possível cancelamento, com o aceno da responsabilização indistinta dos contratantes de empreiteiros. A única modificação em sua redação refere-se à alusão ao objeto específico da empreitada, que seria a construção civil, para justificar a isenção de responsabilidade do “dono de obra”, como se vê:
“CONTRATO DE EMPREITADA. DONO DA OBRA DE CONSTRUÇÃO CIVIL. RESPONSABILIDADE. Diante da inexistência de previsão legal específica, o contrato de empreitada de construção civil entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora”.
Impõe-se recordar, para contextualizar a mudança, que um dos argumentos que levaram à edição do verbete foi a diferenciação entre os contratos de prestação de serviços e os contratos de empreitada, no tocante à supervisão dos serviços prestados que faz sentido no primeiro caso, mas não no segundo, em princípio, uma vez que o seu objeto é a conclusão de uma obra, o que inviabilizaria o reconhecimento da culpa do “dono de obra”.
2.4. Integração de horas extras na base de cálculo da complementação de aposentadoria
Os IUJ’s 119.900/99 e 301.900/05 acarretaram a alteração da redação do item I da Orientação Jurisprudencial 18 da SbDI-1, a qual versava sobre alguns aspectos da complementação de aposentadoria do Banco do Brasil. No aludido item a OJ encontrava-se assim vazada:
“I – As horas extras não integram o cálculo da complementação de aposentadoria; (…)”
Com a modificação, passou a ostentar o seguinte teor:
I – O valor das horas extras integra a remuneração do empregado para o cálculo da complementação de aposentadoria, desde que sobre ele incida a contribuição à Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil – Previ, observado o respectivo regulamento no tocante à integração”.
A principal justificativa para a mudança encontra respaldo na circunstância de que o próprio Regulamento da Previ conteria previsão segunda a qual as horas extras devem integrar a base de cálculo para a contribuição do Empregado à Previ, de modo que não seria razoável excluir a parcela da base de cálculo da complementação de aposentadoria. Em uma analogia com o Direito Previdenciário convencional, se integra o “salário-de-contribuição”, deve também ser considerada no “salário-benefício”.
2.5. Enquadramento sindical do advogado bancário
Afinal, o advogado empregado de banco é bancário? Eis a pergunta sobre a qual se debruçaram os Ministros do TST no IUJ 32.000/97.
Como se recorda, o sistema de enquadramento sindical tem em conta, em nosso ordenamento jurídico, o critério central da atividade econômica preponderantemente exercida pelo empregador para definição tanto da sua categoria econômica, como da categoria profissional a que pertence o empregado, consoante os doutrinadores tem inferido do art. 511 da CLT.
De outro lado, cumpre salientar que a Súmula 102 do TST, em seu item V, prevê que o simples exercício da advocacia por parte de empregado de banco não o submete à jornada de 8 horas prevista no art. 224 da CLT para os bancários detentores de cargo de confiança:
“BANCÁRIO. CARGO DE CONFIANÇA.
(…)
V – O advogado empregado de banco, pelo simples exercício da advocacia, não exerce cargo de confiança, não se enquadrando, portanto, na hipótese do § 2º do art. 224 da CLT.
Daí muitos costumam extrair a conclusão de que o advogado empregado seria enquadrado na categoria dos bancários , pois, caso contrário, seria despicienda e não faria mesmo sentido a previsão do aludido verbete.
Entretanto, ao fim das discussões, prevaleceu entre os Ministros a posição de que os advogados empregados de instituições bancárias não podem ser classificados como bancários, tendo em vista estarem submetidos a um estatuo legal próprio, tal como se dá com as categorias . Como principais corolários, podem ser lembrados os seguintes: a) passam a ser representados pelos sindicatos de profissionais liberais, equiparados aos de categorias diferenciadas; e b) estariam sujeitos, em princípio, à jornada de 4 horas diárias, imposta pelo art. 20 da Lei 8.906/94 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB), ressalvada a hipótese de dedicação exclusiva, que levaria a jornada ao patamar de 8 horas diárias, “ex vi” do art. 12 do Regulamento Geral do Estatuto da OAB.
Registre-se que, não obstante a adoção de tal posicionamento, não houve o cancelamento ou mesmo a alteração do item V da Súmula 102 do TST.
2.6. Prescrição total e parcial da pretensão de complementação de aposentadoria
Quanto à questão da prescrição relativa ao direito de ação para se pleitear complementação de aposentadoria, pode-se afirmar que houve uma simplificação das diretrizes jurisprudenciais sobre o tema.
Mesmo com as Súmulas 326 e 327 do TST estabelecendo critérios relativamente seguros quanto à matéria , a jurisprudência das turmas e da SbDI-1 do TST evoluiu e passou a divisar nuances e fixar distinções em relação a uma miríade de situações específicas, chegando a contemplar quase dez hipóteses distintas .
Com a nova redação conferida aos aludidos verbetes, o Tribunal como que devolveu-lhes o seu espírito original, rejeitando a proposta analítica apresentada pela Comissão de Jurisprudência.
Nessa perspectiva, voltou-se a ter em conta para definir se a prescrição seria parcial ou total apenas dois casos, fundamentalmente: a) o do pedido de complementação de aposentadoria em si mesma; e b) o da postulação de diferenças de complementação de aposentadoria. Na primeira situação, a prescrição seria total e na segunda, seria parcial .
É o que se pode concluir dos novos textos:
326. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. PRESCRIÇÃO TOTAL. A pretensão à complementação de aposentadoria jamais recebida prescreve em 2 (dois) anos contados da cessação do contrato de trabalho.
327. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. DIFERENÇAS. PRESCRIÇÃO. A pretensão a diferenças de complementação de aposentadoria sujeita-se à prescrição parcial e quinquenal, salvo se o pretenso direito decorrer de verbas não recebidas no curso da relação de emprego e já alcançadas pela prescrição à época da propositura da ação.
No último verbete, deve-se consignar apenas que a prescrição apenas será total quanto o pedido de diferenças de complementação de aposentadoria resultar da pretensão de inclusão de parcelas cujo direito de ação já estiver prescrito ao tempo em que a demanda for proposta.
2.7. Horas “in itinere” no deslocamento entre portaria de empresa e local da prestação de serviços
O direito às horas “in itinere” relativamente ao tempo de deslocamento entre a portaria da empresa e o local da prestação de serviços já havia sido reconhecido, já de algum tempo, pela jurisprudência do TST no caso específico da empresa Açominas, dada a distância significativa que havia entre um local e outro, o que resultou na edição da Orientação Jurisprudencial Transistória 36 da SbDI-1 do TST :
“HORA ‘IN ITINERE’. TEMPO GASTO ENTRE A PORTARIA DA EMPRESA E O LOCAL DO SERVIÇO. DEVIDA. AÇOMINAS.
Configura-se como hora “in itinere” o tempo gasto pelo obreiro para alcançar seu local de trabalho a partir da portaria da Açominas”.
Em seguida, passou-se a discutir se tal direito poderia ser estendido aos empregados de outras empresas em situações semelhantes, sobretudo no caso da Volkswagen, o que acabou sendo reconhecido pela jurisprudência quase consensual da Corte, com espeque sobretudo no art. 4º da CLT .
Desse modo, o entendimento que, antes dizia respeito apenas à situação concreta e específica da empresa Açominas, agora foi alargado para todas as empresas, nas quais o tempo dispendido no trajeto interno percorrido pelo empregado passou a ser considerado tempo à disposição do empregador, nos termos do art. 4º da CLT, desde que supere 10 minutos diários, previsto, de certa forma, no art. 58, § 1º, da CLT. Tal entendimento findou por ser cristalizado na nova Súmula 429 do TST:
“TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. ART. 4º DA CLT. PERÍODO DE DESLOCAMENTO ENTRE A PORTARIA E O LOCAL DE TRABALHO. Considera-se à disposição do empregador, na forma do art. 4º da CLT, o tempo necessário ao deslocamento do trabalhador entre a portaria da empresa e o local de trabalho, desde que supere o limite de 10 (dez) minutos diários”.
Importa esclarecer que a opção do TST de não incorporar a diretriz ao texto da Súmula 90, que cuida das horas “in itinere”, deveu-se ao fato de que, em muito casos, o deslocamento dos empregados ocorre a pé e não em veículo fornecido pelo empregador.
2.8. Alcance subjetivo da estabilidade sindical
A Súmula 369 do TST é a principal referência jurisprudencial sobre a garantia provisória de emprego concedida aos dirigentes sindicais. Em seu item II, a súmula restringe a garantia prevista nos arts. 8º, VIII, da CF e 543, § 3º, da CLT ao número previsto no art. 522 da CLT, de sete dirigentes sindicais.
Parte da doutrina criticava o verbete, por entender que o número poderia ser pequeno diante da abrangência e complexidade da entidade sindical. Nesse cenário, foram ventiladas, ao menos, duas teses: a) a de vincular a restrição apenas aos sindicatos de base municipal; e b) a de se fixar uma regra de proporção entre o número de dirigentes sindicais portadores de estabilidade e o número de empregados representados pelo sindicato.
Entretanto, nesse ponto, o texto sumular não foi modificado.
A única alteração que ocorreu refere-se a um aspecto que já foi debatido algumas vezes pelo TST, relativo à inclusão dos suplentes no aludido número máximo de dirigentes estáveis. Já houve quem defendesse a posição segundo a qual o número de sete já incluiria os suplentes.
No entanto, prevaleceu o entendimento de que seria estáveis sete titulares e sete suplentes, com a nova redação conferida ao item II da Súmula 369 do TST:
“DIRIGENTE SINDICAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA.
(…)
II – O art. 522 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. Fica limitada, assim, a estabilidade a que alude o art. 543, § 3.º, da CLT a sete dirigentes sindicais e igual número de suplentes”.
Como se percebe, o item II passou a definir, explicitamente, que a estabilidade sindical alcaçaria, além dos sete titulares, sete suplentes, em um total de 14 dirigentes sindicais, portanto. Assim, pôs-se fim à discussão quanto à inclusão dos suplentes no número indicado no art. 522 da CLT, quanto aos portadores de garantia provisória de emprego.
2.9. Tempo de vigência e aderência das sentenças normativas
Tema tormentoso na doutrina e jurisprudência é o da incorporação dos direitos previstos em normas coletivas aos contratos individuais de trabalho, especialmente quanto à sua possível ultratividade.
Como se sabe, o Tribunal Superior do Trabalho, com a edição da Súmula 277, procurou por fim à celeuma:
“SENTENÇA NORMATIVA. CONVENÇÃO OU ACORDO COLETI-VOS. VIGÊNCIA. REPERCUSSÃO NOS CONTRATOS DE TRABALHO.
I – As condições de trabalho alcançadas por força de sentença normativa, convenção ou acordos coletivos vigoram no prazo assinado, não integrando, de forma definitiva, os contratos individuais de trabalho.
II – Ressalva-se da regra enunciada no item I o período compreendido entre 23.12.1992 e 28.07.1995, em que vigorou a Lei nº 8.542, revogada pela Medida Provisória nº 1.709, convertida na Lei nº 10.192, de 14.02.2001”.
Nesse contexto, o tempo de vigência máximo para os acordos e convenções coletivas de trabalho é de dois anos, conforme previsto no art. 614, § 3º, da CLT , após os quais as condições de trabalho neles previstas retornam (“repristinam-se”, como preferem alguns) aos mínimos legais.
No caso específico das sentenças normativas, o art. 868, parágrafo único, da CLT estabelece um prazo máximo de quatro anos, que foi referendado pelo TST, com a edição do novo Precedente Normativo 120, de seguinte teor:
“SENTENÇA NORMATIVA. DURAÇÃO. POSSIBILIDADE E LIMITES.
A sentença normativa vigora, desde seu termo inicial até que sentença normativa, convenção coletiva de trabalho ou acordo coletivo de trabalho superveniente produza sua revogação, expressa ou tácita, respeitado, porém, o prazo máximo legal de quatro anos de vigência”.
Importante destacar, contudo, que a mais importante inovação, ao contrário do vem sendo noticiado pela imprensa em geral, foi a tese incorporada à primeira parte do texto do PN, conhecida como teoria da aderência limitada por revogação. De acordo com tal postura teórica, as normas coletivas negociadas valeriam até que novo instrumento coletivo viesse a ser celebrado, o que asseguraria um estímulo à autonomia privada coletiva e chegou a ser absorvida pela Lei 8.542/92. Convém ressaltar que a regra será utilizada apenas no caso das sentenças normativas, em princípio, e desde que seja observado o lapso temporal limite de quatro anos.
2.10. Compensação de jornada por meio de acordo coletivo (“banco de horas)
Como se recorda, existem duas modalidades de ajuste de compensação de jornada, admitidas pelo art. 7º, XIII, da CF, à luz da interpretação conferida pelo TST ao preceito constitucional na Súmula 85: a) a individual, firmada diretamente com o empregado e com limite semanal, conforme o item IV da Súmula 85 do TST; e b) a coletiva, ajustada por negociação coletiva com a necessária participação dos sindicatos e com limite anual, nos termos do art. 59, § 2º, da CLT.
Além de referendar a tese da inaplicabilidade do verbete aos acordos coletivos de compensação (conhecidos como “bancos de horas”) , diante das distinções decorrentes do período máximo para compensação, ratificou-se a exigência de negociação coletiva para sua adoção, já prevista no art. 59, § 2º, da CLT. Assim, foi inserido o item V ao verbete:
“COMPENSAÇÃO DE JORNADA
(…)
V. As disposições contidas nesta súmula não se aplicam ao regime compensatório na modalidade banco de horas, que somente pode ser instituído por negociação coletiva.
2.11. Caracterização de sobreaviso em caso de utilização de BIP ou celular
Sobreaviso, como é cediço, consiste no tempo computado na jornada de trabalho em que o empregado permanece em casa, aguardando ordens do Empregador, conforme prevê a CLT, em seu art. 244, § 2º, concedendo o direito a perceber 1/3 de seu salário/hora por cada hora de sobreaviso, em um período máximo de 24 horas. A regra, inicialmente, era destinada aos ferroviários, mas foi expandida, seja por meio de legislação específica – como no caso dos aeronautas, em que o direito foi contemplado no art. 25 da Lei 7.183/84 -, seja por intermédio da jurisprudência que passou a aplicar, por analogia, o instituto a outras atividades profissionais em que se verificassem condições de trabalho semelhantes.
Nessa perspectiva, durante algum ponto, controverteram-se a doutrina e os órgãos jurisdicionais trabalhistas sobre a possibilidade de se configurar a jornada em sobreaviso pela mera utilização de aparelho BIP, como se dava no caso clássico dos médicos. A resposta do TST foi negativa e findou consolidada na Orientação Jurisprudencial 49 da SBDI-1 .
Nesse ponto, com a revisão jurisprudencial, houve apenas a conversão em súmula e a atualização do texto da aludida orientação jurisprudencial. Na recente Súmula 429 do TST, houve a inclusão de referência a outros equipamentos eletrônicos, como o “pager” e o celular, como exemplos de aparelhos de intercomunicação, em lugar do BIP, que é quase uma “espécie em extinção” em tempos de “smartphones” e “tablets”:
SOBREAVISO. O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.
Importante frisar que o critério central para definição do direito às horas de sobreaviso continua sendo a permanência do empregado em sua residência, com comprometimento de sua liberdade de locomoção.
2.12. Adicional de risco portuário
A recentemente editada Orientação Jurisprudencial 402 da SbDI-1 foi, igualmente, objeto de discussões. Eis o seu teor:
“ADICIONAL DE RISCO. PORTUÁRIO. TERMINAL PRIVATIVO. ARTS. 14 E 19 DA LEI N.º 4.860, DE 26.11.1965. INDEVIDO. O adicional de risco previsto no artigo 14 da Lei nº 4.860, de 26.11.1965, aplica-se somente aos portuários que trabalham em portos organizados, não podendo ser conferido aos que operam terminal privativo”.
O debate girava em torno do alcance subjetivo do direito ao adicional de risco portuário previsto no art. 14 da Lei 4.860/65 , especialmente no tocante à extensão da verba aos trabalhadores de portos organizados que laborassem em atividades administrativas, uma vez que a OJ não faz qualquer restrição nesse sentido.
Embora se tenha chegado à conclusão de que, efetivamente, tais trabalhadores não fazem jus ao adicional, preferiu-se manter intacto o verbete.
3. Modificações jurisprudenciais no plano do Direito Processual do Trabalho
Relativamente ao Processo do Trabalho, a jurisprudência do TST passou a reverenciar o principio da informalidade quanto a determinados aspectos, v.g., com o prestígio à manifestação de vontade expressa em petição que requeira intimação em nome de advogado específico contida na nova Súmula 427. De outro lado, contudo, houve o recrudecimento do rigor formal em alguns pontos, como se verificou no caso da definição da guia adequada para o recolhimento de depósito recursal, como se verá.
Um ponto de grande impasse relativamente às regras processuais trabalhistas, foi a proposta de cancelamento da Súmula 219 do TST acerca dos requisitos para a concessão dos honorários advocatícios, na Justiça do Trabalho, em que foram registradas algumas mudanças relevantes.
Objeto de notável controvérsia foi a questão da possibilidade de se produzir prova após confissão ficta, como a decorrente da ausência do empregador à audiência inaugural (CLT, art. 844 ), que resultou na alteração da Súmula 74 do TST.
Vejam-se quais foram as mudanças mais relevante quanto a esses e outros pontos destacados a seguir.
3.1. Requisitos para concessão de honorários advocatícios
Como se sabe, os três principais referenciais jurisprudenciais quanto aos requisitos para concessão de honorários sucumbenciais nas demandas trabalhistas são as Súmulas 219 e 329 , assim como a Orientação Jurisprudencial 305 da SbDI-1 , todas do TST.
De acordo com tais verbetes, o deferimento de honorários advocatícios de sucumbência na Justiça do Trabalho, diversamente do que ocorre no Processo Civil, exige o atendimento cumulativo de dois requisitos: a) o benefício da justiça gratuita; e b) a assistência por sindicato.
Ao fim dos debates, findou-se por manter a restrição extraída da Lei 5.584/70 quanto à necessidade de reconhecimento dos benefícios da justiça gratuita e de assistência sindical, rejeitando-se a alegação de que tais exigências findariam por compelir o empregado a procurar a assistência judiaria em seu sindicato representativo, sob pena de ter de arcar com os honorários advocatícios com o fruto da condenação imposta ao empregador. Não foi aceita, outrossim, a tese de que os empregados poderiam ser ressarcidos dos honorários contratuais pagos aos seus advogados constituídos por meio dos honorários de sucumbência, tendo em vista que o art. 23 da Lei 8.906/94 prevê que esses últimos pertencem aos advogados.
A principal linha de argumentação para sustentar a tese predominante foi a de que seria necessária uma mudança legislativa sobretudo quanto à Lei 5.584/70, para que o TST pudesse rever seu entendimento, muito embora diversos ministros ressalvem entendimento pessoal quanto à matéria .
Foi, contudo, alterado o item II da súmula, para se passar a admitir a concessão de honorários em ação rescisória, em sentido oposto ao anteriormente esposado pela jurisprudência da Corte Superior. Ademais, foi acrescido o item III, referendando-se a previsão da Instrução Normativa 27/05 quanto às lides não-empregatícias , nas quais os honorários podem ser deferidos em face da simples sucumbência, além de se autorizar a concessão na substituição processual realizada por entidade sindical.
Eis o resultado que foi positivado na nova redação da Súmula 219 do TST:
“HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HIPÓTESE DE CABIMENTO
I – Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, nunca superiores a 15% (quinze por cento), não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte estar assistida por sindicato da categoria profissional e comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família.
II – É cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista.
III – São devidos os honorários advocatícios nas causas em que o ente sindical figure como substituto processual e nas lides que não derivem da relação de emprego”.
Destaque-se que o Tribunal não tem acolhido a tese que alguns tribunais regionais têm albergado no sentido de reconhecer direito a perdas e danos aos reclamantes que não atenderem aos requisitos exigidos para concessão dos honorários sucumbenciais .
3.2. Guia para recolhimento de depósito recursal – nova Súmula 426 do TST
A validade do depósito recursal em guia diversa da Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social – GFIP foi a questão posta no IUJ 91.700/06. Nesse ponto, constatou-se a reafirmação de um certo rigor formalna análise dos pressupostos processuais dos recursos trabalhistas, com a edição da Súmula 426 do TST, que exige o recolhimento do depósito recursal, necessariamente, na GFIP, afastando a possibilidade de se utilizar a “Guia para Depósito Judicial Trabalhista” para esse fim (procedimento cuja validade já contava com alguns precedentes no TST), embora admita o depósito judicial “realizado na sede do juízo e à disposição deste, na hipótese de relação de trabalho não submetida ao regime do FGTS”, como é o caso da pequena empreitada.
Assim ficou redigida a Súmula 426 do TST:
“DEPÓSITO RECURSAL. UTILIZAÇÃO DA GUIA GFIP. OBRIGATORIEDADE.
Nos dissídios individuais o depósito recursal será efetivado, mediante a utilização da Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social – GFIP, nos termos dos §§ 4º e 5º do art. 899 da CLT, admitido o depósito judicial, realizado na sede do juízo e à disposição deste, na hipótese de relação de trabalho não submetida ao regime do FGTS”.
Deve-se notar que, no caso do empregador doméstico, não optante do regime do FGTS, o depósito não precisará ser feito por meio da GFIP, consoante a parte final do verbete.
3.3. Validade de intimação em nome de advogado diverso do expressamente indicado – nova Súmula 427 do TST
O mesmo rigor formal não foi observado no IUJ 5.400/04, em que se discutiu a validade de intimação realizada em nome de advogado diverso do que conste em petição na qual se requeira que as comunicações se dêem exclusivamente em nome de determinado profissional.
Havia, essencialmente, três posições: a) a dos que sustentavam a inexistência de norma expressa exigindo que a intimação se fizesse de tal modo, antes o art. 179 do Regimento Interno do TST asseguraria, expressamente, ser “suficiente a indicação do nome de um dos advogados, quando a parte houver constituído mais de um, ou o constituído substabelecer a outro com reserva de poderes”; b) a daqueles que entendiam ser imprescindível o deferimento pelo Relator para que o requerimento de intimação exclusiva pudesse ser atendido; e c) o entendimento de que não basta que a intimação se dê em nome de advogado constituído nos autos, se houver requerimento expresso solicitando que a comunicação seja destinada a um profissional específico, respeitado o principio “pas de nullité sans grief” positivado no art. 794 da CLT.
A terceira tese foi a que prevaleceu, passando a constar da redação de nova súmula, a Súmula 427, de seguinte teor:
“INTIMAÇÃO. PLURALIDADE DE ADVOGADOS. PUBLICAÇÃO EM NOME DE ADVOGADO DIVERSO DAQUELE EXPRESSAMENTE INDICADO. NULIDADE.
Havendo pedido expresso de que as intimações e publicações sejam realizadas exclusivamente em nome de determinado advogado, a comunicação em nome de outro profissional constituído nos autos é nula, salvo se constatada a inexistência de prejuízo”.
3.4. Confissão ficta e produção de prova posterior.
Já o IUJ 801.385/01 levou a duas modificações na Súmula 74 do TST, uma essencial e outra acidental:
“CONFISSÃO.
I – Aplica-se a confissão à parte que, expressamente intimada com aquela cominação, não comparecer à audiência em prosseguimento, na qual deveria depor.
II – A prova pré-constituída nos autos pode ser levada em conta para confronto com a confissão ficta (art. 400, I, CPC), não implicando cerceamento de defesa o indeferimento de provas posteriores.
III- A vedação à produção de prova posterior pela parte confessa somente a ela se aplica, não afetando o exercício, pelo magistrado, do poder/dever de conduzir o processo”.
Como se vê, a mudança formal e menos relevante consistiu na supressão do texto do item I do vocábulo “pena”, em atenção à circunstância de que a confissão ficta não seria, tecnicamente, uma penalidade, mas uma consequência processual, decorrente da inobservância de ônus processual, conforme a doutrina tem pontificado.
De outra parte, houve um acréscimo substancial com a inserção do item III, consolidando o entendimento de que a confissão ficta não obsta a possibilidade de o juiz conduzir, com autonomia e liberdade, o processo e a instrução probatória, à luz do art. 765 da CLT , permitindo que, além de considerar a prova pré-constituída já colacionada aos autos, determine ou autorize a produção de novas provas, uma vez que a vedação de produção de prova posterior somente se aplicaria à parte confessa. Além disso, foi rejeitada a alegação de que o art. 400, I, do CPC impediria tal conclusão, essencialmente, em virtude do fato de que tal dispositivo teria em conta a confissão real e não a ficta.
3.5. Ônus da prova quanto ao vale-transporte e ao recolhimento dos depósitos do FGTS
Em relação à distribuição do ônus da prova, é de se notar que, de um lado, o encargo probatório quanto aos requisitos para concessão de vale-transporte deixou de ser imputado, necessariamente, ao empregado, com o cancelamento da Orientação Jurisprudencial 215 da SbDI-1. Um argumento relativamente frequente entre os doutrinadores trabalhistas era o de que tal diretriz jurisprudencial obrigaria o empregado a demonstrar que fez a solicitação do beneficio, conduta que poderia atrair represálias por parte do empregador.
De outro lado, pode não incumbir mais, de forma absoluta, ao empregador a prova do recolhimento do FGTS, graças ao cancelamento da Orientação Jurisprudencial 301 da SbDI-1. Uma das ponderações trazidas foi a de ambas as partes, empregados e empregadores, têm acesso às informações acerca dos depósitos fundiárias, atualmente, até mesmo pela Internet.
A bem da verdade, o cancelamento dos verbetes exigirá uma análise casuística para se determinar, em cada caso concreto, a quem incumbiria prova o que, com base nos princípios gerais que orientam a produção da prova, inscritos nos arts. 818 da CLT e 333 do CPC, bem como dos princípios particulares do processo do trabalho, que têm recebido o influxo das normas consumeristas, particularmente quanto à teoria da melhor aptidão para a prova.
3.6. Violação direta do art. 7º, XXIX, da Constituição Federal em debate sobre o marco inicial para contagem de prazo prescricional
O objeto do IUJ 6.700/04 foi o debate sobre a possibilidade de configuração de violação direta ao art. 7º, XXIX, da Constituiçao Federal, para efeito de conhecimento de recurso de revista e de acolhimento de rescisória, nas hipóteses em que se controvertesse sobre o marco inicial para contagem do prazo prescricional, sobretudo nos casos dos reflexos da multa de 40% em virtude dos chamados “expurgos inflacionários”, em que se definiu como termo inicial a entrada em vigor da Lei Complementar 110/01 ou, se anterior, o trânsito em julgado de decisão proferida em ação proposta anteriormente na Justiça Federal, que reconheça o direito à atualização do saldo da conta vinculada, nos termos da Orientação Jurisprudencial 344 da SbDI-1 do TST.
Quando se trata da modalidade prescricional a se declarada, se total ou parcial, a Súmula 409 do TST, a qual incorporou a Orientação Jurisprudencial 119 da SbDI-2, já definia que ”não procede ação rescisória calcada em violação do art. 7º, XXIX, da CF/1988 quando a questão envolve discussão sobre a espécie de prazo prescricional aplicável aos créditos trabalhistas, se total ou parcial, porque a matéria tem índole infraconstitucional, construída, na Justiça do Trabalho, no plano jurisprudencial”.
Contudo, foi proposta a edição de súmula para que se consignasse, explicitamente, a possibilidade de se admitir a caracterização de agressão direta ao aludido dispositivo constitucional, sobretudo quando a decisão houvesse adotado tese em sentido oposto ao da referida OJ 344 da SbDI-1, não obstante a existência de jurisprudência do STF que assenta a natureza infraconstitucional de tal controvérsia .
Embora tenha predominado tal posição, findou-se por não editar o verbete, até por conta da ausência de precedentes em numero suficiente para tanto. Ainda assim, a sinalização foi a de se reconhecer a possibilidade de ofensa imediata ao art. 7º, XXIX, da CF, quando se debate o marco inicial do prazo prescricional.
3.7. Fac-símile entre particulares
Nesse aspecto, houve o acréscimo do item IV à Súmula 387 do TST. O objetivo foi o de ratificar o entendimento que já vinha sendo adotado pelo TST, quanto à utilização do fac-símile, nos termos da Lei 9.800/99. A jurisprudência já ressaltava que não se aplicaria a faculdade de utilização do fax, com posterior encaminhamento dos originais em cinco dias, à hipótese em que a transmissão teria se verificado entre particulares. Assim foi vazado o novo item:
RECURSO. FAC-SÍMILE. LEI Nº 9.800/1999.
(…)
IV – A autorização para utilização do fac-símile, constante do art. 1º da Lei n.º 9.800, de 26.05.1999, somente alcança as hipóteses em que o documento é dirigido diretamente ao órgão jurisdicional, não se aplicando à transmissão ocorrida entre particulares.
3.8. Juros de mora em precatório
No tocante aos juros de mora em execução contra a Fazenda Pública, cuja disciplina encontra-se no art. 1º-F da Lei 9.494/97, houve significativa mudança no texto da Orientação Jurisprudencial 7 do Tribunal Pleno, cuja finalidade central foi o de ajustá-la às modificações do mencionado dispositivo legal introduzidas pela Lei 11.960/09.
Dessarte, procurou-se estabelecer referencias exegéticas de direito intertemporal para aplicação das normas que tratam dos juros de mora aplicáveis à Fazenda Pública, inclusive quanto aos precatórios, prevendo, essencialmente, três marcos distintos, cada um dos quais com regramento próprio:
JUROS DE MORA. CONDENAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA.
I – Nas condenações impostas à Fazenda Pública, incidem juros de mora segundo os seguintes critérios:
a) 1% (um por cento) ao mês, até agosto de 2001, nos termos do § 1º do art. 39 da Lei n.º 8.177, de 1.03.1991;
b) 0,5% (meio por cento) ao mês, de setembro de 2001 a junho de 2009, conforme determina o art. 1º – F da Lei nº 9.494, de 10.09.1997, introduzido pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 24.08.2001.
II – A partir de 30 de junho de 2009, atualizam-se os débitos trabalhistas da Fazenda Pública, mediante a incidência dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, por força do art. 5º da Lei n.º 11.960, de 29.06.2009.
III – A adequação do montante da condenação deve observar essa limitação legal, ainda que em sede de precatório.
4. Conclusão
Em conclusão, há de se notar, primeiramente, que, ao assentar as aludidas modificações em suas diretrizes jurisprudenciais, o TST realiza a missão inscrita em seu planejamento estratégico, aprovado por meio da Resolução Administrativa 1.373/09: “Garantir o equilíbrio das relações trabalhistas por meio da uniformização jurisprudencial e da prestação jurisdicional acessível, célere e efetiva”.
Em segundo lugar, entre as constatações que ressaem da rápida análise que se procurou empreender, a mais relevante talvez seja a de que o Tribunal Superior do Trabalho, em seu hercúleo afã de atribuir sentido às leis trabalhistas, resguardando a integridade do direito objetivo, tem encontrado como principal obstáculo ao atingimento de seus objetivos institucionais o escopo semântico demarcado pelo próprio legislador, cujas fronteiras se preferiu respeitar em diversos pontos, como o emblemático caso dos honorários advocatícios.
Por conseguinte, uma conclusão inescapável é a de que, na condição de observador privilegiado da legislação laboral, o TST deve procurar fortalecer sua capacidade de interlocução com o Poder Legislativo, para propor medidas que se destinem ao aperfeiçoamento sobretudo da CLT, mas também da legislação trabalhista esparsa, conforme definido entre os seus objetivos estratégicos pela RA já referida. Esse, aliás, foi o espírito que animou o grupo de normatização que apresentou diversos resultados importantes, mas que não puderam ser aqui abordados, diante da limitação de objeto que se procurou observar no presente trabalho.
Por fim, ao enfrentar tais desafios, a Corte Superior Trabalhista contribuirá para cumprir aquele que também constitui o próprio lema da Justiça do Trabalho, sintetizado na máxima latina “Opus justitiae pax” (em uma tradução literal: “A obra da Justiça é a Paz”), conferindo, desse modo, maior segurança jurídica e estabilidade às relações laborais.