Comentada pelo Doutor Diogo Rais
Por: ESA/OABSP - 27/07/2012
Com o voto decisivo do ministro Dias Toffolli, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu recentemente por 4 votos a 3, que quem tem contas eleitorais sujas poderá ser candidato nas eleições municipais deste ano. De acordo com estimativa do TSE, cerca de 21 mil políticos integram o cadastro da Justiça Eleitoral de contas rejeitadas.
Instrução baixada pelo TSE em março do ano passado, veta as chamadas ‘ contas sujas’, impedindo de concorrer ao pleito os candidatos que não conseguiram ter aprovadas, pela Justiça eleitoral, as prestações de contas de campanhas anteriores. Partidos políticos apresentaram reconsideração da instrução.
A votação, empatada em 3 a 3 foi suspensa com pedido de vista do ministro Dias Toffoli, que posteriormente votou decisivamente, entendendo que basta ao candidato a apresentação das contas para a obtenção da quitação eleitoral, explicando que as consequências da rejeição das contas estão previstas na Lei das Eleições (Lei n.º 9.504/97). O artigo 30-A estabelece que é cabível ao Ministério Público a verificação se é ou não o caso de gasto ilícito e apresentar a denúncia perante a Justiça Eleitoral.
Para comentar a notícia, convidamos o Doutor Diogo Rais, Doutorando em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) com Bolsa do Projeto "CNJ Acadêmico" da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES em parceria com o Conselho Nacional de Justiça e em convênio com a Universidade Presbiteriana Mackenzie, Mestre em Direito Constitucional pela PUC-SP com cursos de extensão em Justiça Constitucional na Université Paul Cézanne. Membro do Comitê Editorial da Revista Brasileira de Estudos Constitucionais (RBEC). Confira abaixo:
A bandeira da ética na política passou a cobrir o nosso sistema enrijecendo os mecanismos de controle e de expulsão dos candidatos que não estão adequados às regras. Essa é uma das maiores conquistas recentes da sociedade democrática, merecendo aplausos e toda força para sua conservação e crescimento. Entretanto, em prol de se fazer o bem, não se pode desconsiderar o certo… Explico melhor: Nem sempre fazer o bem é algo certo, pois o certo vem da certeza, já o bom vem da correspondência entre o que se espera e o que se obtém. Realizar desejos é muito bom, mas ter a certeza dessa realização é muito improvável. Neste paradoxo romântico se encaixa, a meu ver, a recente conturbação que o TSE enfrentou com suas decisões antagônicas diante da expedição da quitação eleitoral e as contas de campanha.
Em 01.03.2012, por 4 votos a 3 (sendo vencedores as Ministras Nancy Andrighi, Cármen Lúcia e os Ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio; e vencidos os Ministros Arnaldo Versiani, Marcelo Ribeiro e Gilson Dipp) o TSE decidiu que para obter a certidão de quitação eleitoral (requisito para concorrer às eleições) os candidatos não poderiam ter suas contas de campanha desaprovadas. Essa decisão inseriu o parágrafo 2º no art. 52 da Resolução n. 23.376 do TSE: “§ 2º Sem prejuízo do disposto no § 1º, a decisão que DESAPROVAR as contas de candidato implicará o impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral.”
O problema é que a Lei das Eleições (Lei n. 9.504/97) dispõe: “Art. 11, § 7º A certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a APRESENTAÇÃO de contas de campanha eleitoral”.
Um determinado partido político ingressou com pedido de reconsideração cuja principal alegação foi a contrariedade entre a decisão e a Lei. Esse pedido, posteriormente, foi endossado por outros 17 partidos políticos.
Em 28.06.2012 o Min. Dias Toffoli apresentou seu voto-vista formando maioria a favor do deferimento da reconsideração em conjunto aos Min. Gilson Dipp, Henrique Neves e Arnaldo Versiani, ficando vencidos as Min. Nancy Andrighi (relatora), Cármen Lúcia e o Min. Marco Aurélio, decisão novamente por 4 votos a 3, mas agora reconsiderando a decisão anterior.
O Min. Dias Toffoli entendeu que a legislação eleitoral estabelece que a certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a apresentação de contas de campanha, em suas palavras: “O legislador pretendeu disciplinar a matéria de forma clara, estabelecendo um critério legal que até então era disciplinado apenas por meio de instruções desta Corte. Não vejo como suplantar o texto da lei, para estabelecer requisito não inserido no dispositivo legal”. Ressalvou ainda, que as contas apresentadas de forma fajuta, isto é, sem os documentos que possibilitem sua análise devem ser consideradas não prestadas e por conseguinte, negada a certidão de quitação eleitoral.
A reconsideração do TSE, a meu ver, foi acertada, pois a bandeira da ética na política deve sim pairar sob a democracia e toda a sociedade, mas não pode abafar e asfixiar a própria Lei, em suma: Em um Estado Democrático de Direito não é viável afastar o Direito, nem mesmo em nome da saúde da democracia, pois, exceções como estas podem hoje ser saudáveis, mas no futuro, quem garantiria isso? … O Direito? … A Lei? Mas que força eles teriam?